No evento Melhores Empresas da Bolsa, Rodrigo Osmo destacou recuperação mais rápida do que a esperada no setor, mas ressaltou desafios de produtividade

SÃO PAULO – A retomada do setor de construção civil após um período de apreensão no auge da pandemia de coronavírus foi notória e também surpreendeu a Tenda (TEND3), conforme destacou Rodrigo Osmo, CEO da companhia, voltada para os segmentos de baixa renda.

A empresa foi premiada como a melhor do setor de consumo durante o evento Melhores Empresas da Bolsa, do InfoMoney e do Stock Pickers, realizado na noite desta quinta-feira (26).

“O resultado foi muito surpreendente para nós. Em março, com a quarentena iminente, assumimos que 80% das vendas iriam diminuir, estávamos nos preparando para operar com vendas muito menores (…) Para a nossa grata surpresa, estávamos redondamente enganados. O terceiro trimestre foi o melhor de vendas para a companhia”, avaliou Osmo durante o evento.

Vale ressaltar que a companhia divulgou seu resultado do terceiro trimestre no início de novembro, registrando um lucro líquido de R$ 70,5 milhões, 75% maior na comparação com abril e junho deste ano e alta de 9,1% na base anual. As vendas líquidas atingiram R$ 742,1 milhões no período, alta de 38,2% na base anual, sendo o melhor trimestre da história da companhia.

Segundo Osmo, alguns elementos ajudam a explicar esse movimento: dentre eles, a mensagem “quase subliminar “de que, durante a pandemia, houve uma percepção maior de que casa é segurança. Ou seja, as pessoas viram mais importância de terem alternativa de habitação.

“Assim, empresas com marca mais forte se sobrepuseram. Se uma pessoa vai comprar um bem tão valioso como o primeiro imóvel, ainda mais em um ambiente online [por conta das restrições de mobilidade], sem olhar para a cara do vendedor, ela vai comprar de alguém que tenha credibilidade”, avalia. Segundo Osmo, a companhia estava  muito bem preparada para a transformação digital, com a transição para o online ocorrendo de forma muito rápida.

Questão de produtividade

Apesar da forte recuperação do setor em relação ao período da pandemia, uma questão que chama a atenção entre as construtoras é que a produtividade evoluiu muito pouco nos últimos 20 anos, conforme ressaltou Marcos Peixoto, gestor da XP Asset, que também participou do painel.

Neste sentido, Osmo ainda foi mais longe e falou que o setor evoluiu pouco não apenas nos últimos 20 anos, mas nos últimos 2 mil anos. “A lógica construtiva remete ainda ao tempo dos egípcios. Em dados concretos, há um paradoxo muito interessante. O setor de construção civil é o maior do mundo, de US$ 9 trilhões, o que representa 13% do PIB mundial, e é o setor mais ineficiente do mundo”, afirma.

O CEO da Tenda faz uma comparação e aponta que, ao olhar para os dados de 70 anos atrás e comparar com os de agora, a produtividade dos trabalhadores da agricultura se multiplicou por 14, de varejo e da indústria em 8, enquanto da construção civil é basicamente a mesma. “Esse é quase o elo perdido da nova economia”, avalia.

Osmo ressalta que é um desafio trazer essa nova mentalidade de ganhos de produtividade para o setor de construção mas que, dentro das operações da empresa, há uma visão muito clara de como esse processo deve ser feito: através da industrialização da construção civil.

“É tirar as atividades do canteiro e colocar numa fábrica. A empresa até hoje vem ganhando eficiência através do que chamamos de abordagem industrial, mas essa abordagem acontecia dentro do canteiro [de obras]. Nosso entendimento é de que se chegou quase ao limite da otimização [nesses termos]. Para continuar otimizando, precisaria tirar as atividades do canteiro e colocar numa fábrica. Ou seja, construir apartamentos numa fábrica e simplesmente montá-los num canteiro, essa é a nossa visão de futuro”, avalia o CEO.

Preocupações e oportunidades de curto prazo 

Olhando mais para o curto prazo, o CEO ressalta que a alta dos custos preocupa, com os principais insumos como aço e concreto registrando aumentos substanciais dos preços. “Não sofremos com o aumento de mão-de-obra porque eles são mais percebidos em períodos de dissídio. Mas, como o material de construção aumentou, é bem possível que o dissídio venha num patamar acima do que tem vindo historicamente”, avalia.

Com relação à alta dos preços dos terrenos, Osmo ressalta que, apesar de ter operações no país inteiro, o mercado principal é São Paulo, em que há o sentimento de um forte aumento da concorrência. Ele cita a abertura de capital (IPO, na sigla em inglês) da Cury (CURY3) e da Plano & Plano (PLPL3), duas empresas focadas no mesmo mercado da Tenda e na mesma região.

“Esse é um sintoma de que o mercado de São Paulo é muito competitivo e a competição é sentida através dos terrenos. A nossa expectativa é de que haja sim uma maior competição por terrenos, que deve gerar uma pressão nas margens daqui para frente”, aponta.

Por outro lado, ele avalia que existe demanda para continuar expandindo mesmo em um ambiente ainda incerto para a economia no próximo ano: “o Brasil forma cerca de um milhão de famílias de renda baixa, de 4 salários mínimos por ano, enquanto a oferta através de programas habitacionais é de 400 mil. Assim, existe uma demanda reprimida enorme no nosso segmento. Isso é nítido uma vez que, mesmo em momentos recessivos, as empresas continuaram vendendo muito bem”.

Para o CEO, o grande desafio é “fechar a conta”, uma vez que a capacidade de pagamento do cliente é restrita, o que aumenta a importância de haver ganhos de eficiência cada vez maiores na companhia.

Neste sentido, Osmo avalia que a baixa taxa de juros no Brasil, com a Selic atualmente a patamares mínimos de 2% ao ano, é uma condição necessária para o desenvolvimento de um mercado de financiamento imobiliário mais robusto, de forma a torná-lo menos dependente de programas do governo. Contudo, ainda há dúvidas sobre quão baixos deveriam ser os juros e, mais ainda, por quanto tempo eles ficariam nesses patamares para que o financiamento para a habitação popular seja suprido por uma solução de mercado.

“No curtíssimo prazo, a nossa visão é que a menor taxa de juros libera funding [financiamento] para habitação popular nas faixas de entrada porque os segmentos acima podem ser supridos pelo mercado, liberando o balanço do FGTS. No médio prazo, se as taxas de juros persistirem em patamares muito baixos, é sim possível uma solução de mercado, mas não é algo que eu acredite que seja muito substancial nos próximos 5 anos. Precisaríamos de fato ter uma condição estrutural de juros muito baixa permanente por mais tempo”, avalia.

Osmo, por sua vez, vê pouco risco de uma possível diminuição dos programas de habitação governamentais lembrando que o atual, apesar de indicar um viés mais liberal na área econômica, lançou recentemente o Casa Verde Amarela, com uma estrutura muito parecida com o Minha Casa Minha Vida.

Fonte: InfoMoney

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